Jair Bolsonaro fez sua estreia na Assembleia Geral da ONU com um discurso "míope" por enxergar um mundo multipolar sob a ótica da Guerra Fria, avalia o professor de Política Internacional da UERJ Paulo Velasco.
Em Nova York para um dos eventos mais importantes da diplomacia mundial, o presidente brasileiro criticou a "ditadura cubana", afirmou que o programa Mais Médicos representava "um verdadeiro trabalho escravo" e disse que está trabalhando com os Estados Unidos "para que a democracia seja restaurada na Venezuela".
"Presidentes socialistas que me antecederam desviaram centenas de bilhões de dólares, comprando parte da mídia e do Parlamento", disse Bolsonaro.
Velasco ressalta que a fala do presidente "foge do padrão diplomático brasileiro" desde, pelo menos, 30 anos.
"Bolsonaro começou fazendo um discurso que mais parecia saído de um período de Guerra Fria, com referências o tempo todo aos riscos do socialismo no Brasil, algo que pareceu um pouco fora de tom quando consideramos o que é a realidade contemporânea, um mundo claramente pós-Guerra Fria onde as questões não se resolvem mais nesse embate entre capitalismo e socialismo", afirma o professor da UERJ à Sputnik Brasil.
Velasco também ressalta que Bolsonaro tem uma "visão muito infantil e simplista, para não dizer extremamente deturpada" sobre a realidade e mostrou seu "despreparo" ao apresentar sua interpretação "bastante retorcida" dos fatos ao chegar perto de trabalhar com um "um plano de teorias conspiratórias".
Amazônia
"Quero reafirmar minha posição de que qualquer iniciativa de ajuda ou apoio à preservação da floresta amazônica, ou de outros biomas, deve ser tratado em pleno respeito à soberania brasileira. Estamos prontos para, em parcerias e agregando valor, aproveitar de forma sustentável todo o nosso potencial", disse Bolsonaro na ONU.
O presidente brasileiro também disse que a Amazônia "não está sendo devastada e nem consumida pelo fogo, como diz mentirosamente a mídia".
A Amazônia esteve recentemente no centro de uma disputa diplomática entre Bolsonaro e o presidente francês, Emmanuel Macron, que acusou o mandatário brasileiro de mentir sobre seu compromisso ambiental.
Dados do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE) indicam que foram registrados 30.901 focos de incêndio na região amazônica em agosto de 2019, quase o triplo do mesmo mês em 2018, quando foram 10.421 casos.
Velasco acredita que Bolsonaro erra o tom ao falar sobre a maior floresta tropical do mundo: "O problema é assumir um discurso estritamente soberanista, no sentido de dizer 'a Amazônia é nossa, e nós cuidamos do modo como achamos adequado, sem prestar contas a ninguém'. Não é por aí, os temas internacionais, que têm impacto e alcance transnacional, como é a questão ambiental, têm que ser trabalhados no ambiente multilateral. Apesar do Brasil ser soberano, ele tem, sim, que prestar contas sobre o que está acontecendo."
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